Ato pede que Justiça reverta decisão que manda mãe entregar filho ao pai

 

Uma manifestação organizada por meio de redes sociais reuniu dezenas de pessoas nesta sexta-feira (28) em frente ao Fórum do Riacho Fundo, no Distrito Federal, para tentar sensibilizar a Justiça a reverter a decisão que determina que um menino de 6 anos volte a morar com o pai. Um vídeo que circula na web mostra o desespero da criança no momento em que recebe a notícia.

No registro, feito na noite de quarta, o menino chora, diz que não quer largar a mãe de novo e pede para ser deixado em uma sala. A decisão judicial foi tomada após cinco horas de audiência. Tia do garoto, Sarah Almada conta que Rosilene chegou a precisar de atendimento médico depois de ouvir a decisão. Foi ela quem filmou a reação da criança.

Em nota nesta quinta-feira, o TJ disse que não se pronunciaria sobre o caso, “uma vez que o processo está em segredo de Justiça e decisão judicial deve ser questionada judicialmente”. O Ministério Público informou que também não comentaria.

O grupo levou cartazes reforçando os pedidos da criança no vídeo. Motoristas que passavam pela rua do fórum buzinavam em apoio ao ato. Muitas mulheres estavam acompanhadas dos filhos e gritavam por justiça.

A pedagoga Aline Macedo disse acreditar que dois fatores pesaram na decisão do juiz: o de a defesa da mãe não ser tão preparada quanto a do pai e o de o garoto não ter sido ouvido. Para ela, a reação do menino à notícia não pode ser considerada normal.

“O desespero dele ficou evidente no vídeo. Acredito que, não só como eu, que estou aqui com minha filha, que viu o vídeo e pediu para vir aqui, mas que há chance de o juiz rever essa decisão. A mãe, por ser humilde, não teve como ter um advogado mais empenhado e com mais competência”, declarou.

A mulher também afirmou ver falta de sensibilidade da parte do magistrado. “Apesar de ter 6 anos, ele [o menino] já tem autoridade para dizer o que quer para ele. Faltou dar um pouco mais de voz para a criança.”

A servidora pública Marinete Blanco conta que também perdeu a guarda dos filhos após a separação e que, de alguma forma, se viu na situação. Ela diz que sentiu vontade de abraçar e proteger a criança enquanto assistia às imagens. “O Brasil hoje chora com o choro do Samuel. Acho que o juiz pode rever essa situação para que não ocorram mais fatalidades como essa”, afirmou.

Responsável por criar o evento no Facebook, a fisioterapeuta Márcia Silva diz estar mobilizada para ajudar a criança. Ela conheceu o caso via web e se disse incomodada com a falta de novas informações sobre o menino.

“A gente está sem notícias do Samuel, a gente não conhece a família, aí a gente decidiu fazer o protesto. Tem muita gente sensibilizada. A gente posta informação e muita gente quer mais informação também. A gente quer entender porque o juiz não ouviu o Samuel.”

Amigo da mãe e chamado no vídeo de “tio” pelo garoto, Israel Souza diz que toda a família se abalou com a notícia de que a criança voltaria a morar com o pai. Ele conta que o garoto estava fazendo tratamento e tomando remédios neurológicos por causa dos traumas que teria adquirido vivendo com pai e madrasta.

“Meu irmão está acabado. Nessas férias agora da escola, ele tem uma filha, e ele pegava o Samuel para ficar junto. Meu irmão está sofrendo muito. Na residência dos meus pais, ele [o menino] até abraçou o Rafa e perguntou ‘Rafa, por que você não pode ser meu pai?’. Corta nosso coração.”

Decisão judicial
A advogada e professora de direito Renata Malta afirmou ao G1 ser “ótimo” que a sociedade se mobilize para ajudar uma criança em sofrimento, mas que isso não pode influenciar a decisão judicial. Ela também disse que é preciso levar em conta que o vídeo mostra apenas uma parte da história.

“Como jurista, o juiz não pode ceder ao clamor público. A emoção que retrata o vídeo é patente. As pessoas se emocionaram com o vídeo. Mas, quando o juiz faz uma análise, o vídeo é um dos elementos existentes para ele fazer uma análise. Mesmo que a sociedade se manifeste nesse sentido de repúdia à posição dele, é ele quem tem o conhecimento de tudo o que está relacionado àquela criança”, explica.

O garoto passou os últimos quatro meses morando com a mãe, Rosilene Batista Silva, que diz que foi buscá-lo no interior de São Paulo após ouvir da ex-cunhada que ele era maltratado. Ela e o pai da criança viveram juntos durante um ano, e a mulher conta que só deu a guarda do filho ao homem porque ele a ameaçava de morte.

O G1 procurou o advogado do pai por meio de redes sociais, celular e escritório. Colegas informaram que ele está de férias, e o profissional não deu retorno à reportagem. As alegações de que o menino sofria maus-tratos são controversas.

Uma foto obtida pelo G1 mostra a criança junto com o pai em um local público, sorrindo e beijando o homem no rosto. Não há informação sobre o local e a data em que a foto foi feita. No processo, uma conselheira tutelar da cidade onde o menino morava até então diz que não havia indícios da situação.

No DF, no entanto, outra profissional relata ter ouvido do garoto que ele sofria maus-tratos do pai e da madrasta e que queria continuar vivendo com a mãe em Brasília. Uma assistente social do Ministério Público afirma que a criança se referia ao pai como alguém de quem tivesse medo.

O pai tinha a guarda da criança desde 2012. Rosilene diz que trouxe o filho para Brasília sem consultar o ex-marido, depois de uma visita ao menino. Ela afirma ter procurado orientação jurídica antes de tentar reaver a guarda da criança.

“Eu cheguei lá, eu já tinha procurado orientação da Defensoria [Pública], da Vara da Criança [Infância e Juventude], que me orientou ‘Rosi, vai para lá, se você vir que seu filho está em situação de risco você traz, porque dentro da nossa jurisdição a gente pode ajudar’. Nós trouxemos ele no dia 6 de setembro”, conta a mãe. Ainda em setembro, a mulher conseguiu a guarda provisória do menino.

A mãe também alega que registrou queixas contra as agressões que alega ter sofrido, mas que as retirou por medo da reação do ex-marido. Ela diz que ficou dois anos sem poder ver a criança. Fonte: G1