Filhos de pacientes com hanseníase terão que deixar colônia em Bauru
As famílias dos pacientes do Instituto Lauro de Souza Lima que moram na antiga Colônia Aimorés, em Bauru (SP), receberam este mês um comunicado de que os filhos maiores de 21 anos terão de deixar as casas até o fim deste ano.
O documento, emitido pela Secretaria de Estado da Saúde, causou preocupação e revolta nesses pacientes que, no passado, foram abrigados – e isolados – no local para tratar a hanseníase e que há anos fixaram residência na colônia.
A mensagem, direcionada a esses moradores do antigo asilo-colônia, informa que os filhos maiores de 21 anos dos pacientes que ainda vivem nas casas ao lado do instituto só vão poder permanecer no local até o próximo dia 31 de dezembro.
O Instituto Lauro de Souza Lima informou que a unidade comporta 68 moradores, dos quais 20 são pacientes, e que a medida “respeita os direitos das pessoas envolvidas nesses processos”.
Morador da colônia há 50 anos, Antônio Carlos Bertoche chegou ao local ainda criança quando o pai foi diagnosticado com hanseníase. Ele ficou no local, formou família e atualmente seu filho o ajuda nas tarefas de casa.
“Tenho problemas de saúde, meu filho me ajuda e isso [comunicado] nos pegou de surpresa. Tem pessoas que praticamente nasceram aqui e nem sabem como viver lá fora, vai ser complicado”, disse Bertoche.
Elias de Souza Freitas chegou à colônia na década de 1960: “Falta respeito, pois até 1945 a gente era apenas uma bacilo que falava” — Foto: TV TEM/Reprodução
Outro morador da colônia, Elias de Souza Freitas chegou na década de 1960 para se tratar da hanseníase e também se assustou com a notícia de que parte de sua família terá que deixar a casa.
“Aos 81 anos eu achava que a vida já estivesse resolvida e que poderia terminar meus dias ao lado dos filhos. É uma falta de respeito, porque até 1945 é como se eu não existisse, eu era apenas um bacilo que falava”, desabafa Souza.
Para tentar resolver o impasse, uma comitiva formada por vereadores de Bauru e pelo prefeito Clodoaldo Gazzetta marcou reunião na próxima semana com o governador Márcio França. Segundo o grupo, o principal problema alegado pelo estado seriam os gastos com água e luz dessas casas.
Histórico
As casas da antiga Colônia Aimorés foram construídas numa área da Sociedade Beneficente Dr. Enéas Carvalho de Aguiar.
A entidade, criada em 1934 com o nome Caixa Beneficente do Asilo-Colônia Aymorés, surgiu com a função de receber donativos da comunidade para a construção do então “leprosário de Bauru”.
Ao longo dos anos, a sociedade passou a dar suporte ao hospital que no futuro se transformaria em referência no tratamento de hanseníase.
Como o local foi concebido para isolar os pacientes de uma doença que até então era considerada sem cura e cujos pacientes era discriminados, a colônia assumiu a condição de uma pequena cidade fechada.
Havia praças, cinema e até foram abertas fábricas de sabão e de guaraná. Os moradores também se dedicavam à produção de produtos hortifrutigranjeiros.
Em 2014, todo o complexo do antigo Asilo-Colônia Aimorés e que hoje abriga o Instituto de Lauro Souza Lima foi tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico do estado de São Paulo.
Outro lado
Em nota, o Instituto Lauro de Souza Lima informou que a unidade comporta 68 moradores, dos quais 20 são pacientes. O texto explica que a residência na antiga colônia é restrita a familiares de pacientes ainda em atendimento, conforme resolução estadual.
A nota diz ainda que a reintegração de posse que tem prazo até dezembro é amparada judicialmente e que todas as medidas “são desenvolvidas em conformidade com a legislação, respeitando os direitos das pessoas envolvidas nesses processos”. Fonte G1