Tema da redação do Enem 2019 é ‘Democratização do acesso ao cinema no Brasil’

O tema da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem 2019) é “Democratização do acesso ao cinema no Brasil”.

Segundo professores ouvidos pelo G1, o tema não estava entre as principais apostas e discussões nos cursinhos ou redes sociais durante o ano, e a área de cultura há anos não aparecia no Enem. Mas a surpresa não chega a fazer do Enem 2019 uma prova difícil para os candidatos.

Já os cineastas ouvidos pelo G1 afirmaram que a democratização do acesso ao cinema no Brasil ainda está longe da realidade. Eles citaram argumentos que poderiam ser usados pelos candidatos, como diversidade de temas nas telas, variedade de produtores na execução dos projetos e até o valor do ingresso, que em geral é caro no país.

Nas redes sociais, alguns internautas elogiaram o tema, enquanto outros ficaram felizes de não estarem entre os candidatos neste ano. Muitos perceberam que, há cinco dias, as redes sociais do Ministério da Educação deram um “spoiler” do tema, anunciando uma parceria do ministério com a Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) para que salas de cinema sejam adaptadas a pessoas com deficiência.

Os estudantes tiveram acesso a textos de apoio para compor a argumentação, como:

  1. um trecho do artigo “O que é cinema”, de Jean-Claude Bernardet;
  2. um trecho do texto “O filme e a representação do real”, de C.F.Gutfreind;
  3. um infográfico do periódico “Meio e a Mensagem” sobre o percentual de brasileiros que frequentam as salas de cinema;
  4. um trecho do texto “Cinema perto de você”, da Ancine.
Proposta de redação da prova do Enem 2019 - CADERNO AMARELO — Foto: Reprodução Inep

Proposta de redação da prova do Enem 2019 – CADERNO AMARELO — Foto: Reprodução Inep

ANÁLISE DOS PROFESSORES

O professor de redação do Sistema de Ensino pH Thiago Braga, do Rio de Janeiro, disse ao G1 após o anúncio que o tema é inesperado e não houve discussão tão grande sobre ele nesse ano.

“Mas é uma discussão importante porque a gente tem o cinema como uma arte que é muito deixada de lado no Brasil, embora muito bem produzida no Brasil”, afirmou Thiago Braga, do pH.

Segundo ele, sem os textos motivadores não é possível saber que enfoque o Enem vai dar ao tema. Braga sugere algumas abordagens possíveis, desde a produção audiovisual no país até o acesso de todos os setores da população ao audiovisual, inclusive as famílias de baixa renda.

A professora Isabela Arraes, do CPV Vestibulares, de São Paulo, afirmou que, apesar de inusitada, a proposta da redação do Enem 2019 não pode ser considerada difícil.

“Foi compatível com o que o exame costuma cobrar dos candidatos, se considerarmos que o tema sempre traz uma questão de viés social que deverá ser analisada criticamente pelos alunos. A questão foi alvo de discussões na internet, principalmente devido aos últimos cenários envolvendo a Ancine e os cortes na cultura do país” – Isabela Arraes, professora de redação

Ainda de acordo com Isabela, a democratização do acesso ao cinema é uma questão social muito pertinente.

“Inclusive, dava margem a algumas análises polêmicas, na contramão do clima de tensão do momento político que o país está vivendo: assim, o Enem optou por solicitar uma discussão extremamente importante no que diz respeito à aquisição dos conhecimentos proporcionados pela indústria cinematográfica”, afirmou a professora.

Para o professor de redação Rogi Almeida, do Curso de Redação, em Teresina, o estudante pode se surpreender porque o tema não foi abordado em provas mais recentes.

“Eles pegaram um eixo temático que há muito tempo não era abordado, que é cultura. O aluno tem que fazer a problematização para o acesso à cultura e ao cinema e como a partir de um filme se tira várias discussões sociais.” – Rogi Almeida, professor de redação

Rogi Almeida ainda diz que é possível usar exemplos na abordagem. “Um exemplo é o Coringa, um filme a partir do qual se discute a violência, as doenças psíquicas, entre outros temas.”

ARGUMENTOS DE CINEASTAS

Bruno Barreto, diretor de filmes como “Dona Flor e seus dois maridos” e “O que é isso, companheiro?”, que foi indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro, afirma que “estamos ainda muito longe da democratização do acesso ao cinema brasileiro”.

“A arte precisa de dinheiro, mas também de mecanismos para facilitar o acesso, para democratizar, fazer com que pessoas com baixo poder aquisitivo tenham acesso ao audiovisual. A maneira realista de isso acontecer é nas plataformas e na televisão” – Bruno Barreto, cineasta

Para Marcelo Gomes, diretor de filmes como “Estou me guardando para quando o Carnaval chegar” (2019) e “Cinema, Aspirina e Urubus” (2005), a democratização do cinema leva o país a construir uma identidade.

“O cinema é o espelho da nossa cultura. Já foi dito que um país sem cinema é uma casa sem espelhos. A gente tem que democratizar, fazer chegar a todas as camadas da população, não apenas em shoppings com ingressos caros. Milhares e milhares de cidades do Brasil não têm cinema. É uma forma de as pessoas acessarem mais conhecimentos, é fundamental ao país.” – Marcelo Gomes, cineasta

A cineasta Laís Bodanzki afirma que a democratização do acesso ao cinema precisa incluir a diversidade de temas abordados na tela e também ao ingresso à sala de exibição. Bodanzky é presidente da SPCine – empresa da prefeitura de São Paulo responsável pelo fomento, estímulo e difusão do audiovisual na cidade de São Paulo – e diretora de filmes como “Como nossos pais” (2017), “As melhores coisas do Mundo” (2010), “Bicho de Sete Cabeças” (2000), entre outros.

“Quando falamos de democracia do cinema, falamos também sobre o que está na tela, quem tem direito de assistir a este filme e quem tem direito de fazer” – Lais Bodanzki, cineasta

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