Testemunha da morte de jovem em abordagem da PM em Ourinhos relata ameaça
Uma testemunha do assassinato do jovem Bryan Bueno da Silva, morto durante uma abordagem policial no dia 9 de junho quando saía de uma festa em Ourinhos (SP), registrou um boletim de ocorrência contra PMs por supostas agressão e intimidação. O caso teria acontecido no último domingo (31) em Santa Cruz do Rio Pardo.
“Ela [a vítima> alega que estava em um evento na cidade e foi abordada, e nesta abordagem ela teria sido reconhecida como testemunha do caso ocorrido no mês passado em Ourinhos. E ela teria sido hostilizada pelos policiais. No final da abordagem, após sofrer ameaças e ofensas, ela teria sido agredida com um soco”, diz o delegado Renato Caldeira Mardegan.
Wesley Valheiro Morais, de 18 anos, estava no banco traseiro do carro quando Bryan morreu. Ele presenciou a abordagem dos policiais na saída da festa e o momento em que o soldado Luiz Paulo Izidoro atirou contra Bryan, que estava no banco do passageiro da frente. O jovem de 22 anos morreu com um tiro no pescoço.
O comando a polícia alega que o disparo foi acidental, mas a Justiça aceitou a denúncia do Ministério Público contra o policial, que é réu e responde por homicídio doloso, quando há intenção de matar. O policial chegou a ser preso, mas responde aos processos civil e militar afastado das funções.
Wesley já depôs na ouvidoria da Polícia Militar incriminando o policial e, segundo o delegado, o jovem acredita que a atitude dos policiais de Santa Cruz do Rio Pardo, cidade vizinha a Ourinhos, foi pra intimidá-lo no processo.
A Polícia Civil investiga o caso como injúria, ameaça, coação e abuso de autoridade. A vítima e duas testemunhas foram ouvidas. Segundo o delegado, os policiais que trabalharam no dia também serão ouvidos para os suspeitos serem identificados. Também foi solicitado a ficha clínica que Wesley dia ter passado por atendimento médico para anexar à investigação.
O Condepe, Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Humana, que tem acompanhado prestado apoio juridico à familia de Bryan, informou que estuda solicitar que o Wesley seja incluído na lista do programa de proteção a testemunhas do estado.
A produção da TV TEM entrou em contato com a Polícia Militar, mas até a publicação desta reportagem não teve retorno.
Disparo acidental
O policial que atirou e matou o jovem prestou depoimento à Polícia Civil e não quis dar entrevista na época da ocorrência, mas segundo o advogado dele, Osny Bueno de Camargo, o disparo foi acidental e provocado por um defeito na arma. “A versão única e exclusiva e que é a verdade. A arma disparou acidentalmente. Essa arma tem apresentado no Brasil inúmeros defeitos”, explica Osny.
O advogado afirmou também que a abordagem foi feita obedecendo às normas de conduta da Polícia Militar. “Operação padrão de quem não respeita a ordem que foi dada, que era para descer do carro. Eles desobedeceram e é assim que o policial tem que abordar, armado. É para isso que existe a polícia.”
De acordo com o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condeph) que teve acesso ao interrogatório, o policial disse ao delegado que a arma estava em posição sul, ou seja, apontada para baixo e o dedo não estava no gatilho, no entanto, a arma disparou. Ainda segundo o órgão, o policial disse também que os jovens desobedeceram a ordem de sair do carro.
O laudo feito pela Polícia Militar apontou que a pistola não apresentou defeito. O laudo foi entregue à Polícia Civil. O Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condeph) teve acesso aos documentos e encaminhou à TV TEM. O laudo foi requisitado pela Polícia Civil no início da investigação. De acordo com os documentos, o sistema de segurança e a trava do percussor não apresentavam irregularidades. Quanto à funcionalidade, não foi verificado defeito que possibilitasse o disparo do gatilho sem pressioná-lo. O documento é assinado por peritos da Polícia Militar.
Em nota, a PM informou que mantém a posição de homicídio culposo, sem intenção de matar, pois em nenhum momento houve a intenção policial em cometer aquele ato. Ainda segundo a nota, também não foi o caso de assumir o risco, pois deveria haver dolo em sua ação, mas não houve, foi uma fatalidade. A PM considera como uma posição totalmente equivocada esse indiciamento da Polícia Civil.
Para Polícia Civil, além de assumir o risco de matar pela forma como foi feita a abordagem, o policial também colocou em risco a vida das outras pessoas que estavam no veículo e não dando a chance de defesa de Bryan.
Imagens da abordagem
A produção a TV TEM teve acesso ao vídeo que mostra a abordagem policial. As imagens foram cedidas pelo Conselho Estadual de Defesa Humana (Condeph) que também apura o caso (veja as imagens acima).
O vídeo do circuito de segurança de um estabelecimento comercial próximo estava em posse da Polícia Militar e só foram enviadas ao delegado após ele enviar um requerimento à Justiça. A gravação que a TV TEM teve acesso começa às 2h30.
O local está movimentado por causa de uma feira de exposições que era realizada na época. Quatro minutos depois, uma ambulância do Samu passa com o giroflex ligado e segue em direção ao recinto onde é realizado o evento, possivelmente para fazer um atendimento. Às 2h36, o policial que fez o disparo contra Bryan aparece subindo a avenida em que os fatos ocorreram.
Um minuto depois, outro policial para o carro onde estava Bryan e quatro amigos. O primeiro policial que subiu a rua reaparece, se aproxima do carro já tirando a arma da cintura e parece fazer gestos de ameaça aos jovens e logo dispara. É tudo muito rápido. Logo em seguida os quatro ocupantes do carro saem do veículo, pelo lado do motorista. Os policiais também se afastam do carro e logo muita gente começa a se aproximar para ver o que acontecido.
Às 2h40, o vídeo mostra que os policiais param a ambulância do Samu que minutos antes tinha passado pelo local. É possível ver que eles pedem o atendimento, um dos PMs chega até abrir a porta da ambulância.
As imagens mostram ainda que o jovem teve uma parada cardiorrespiratória, porque os médicos iniciam a massagem cardíaca e durante 12 minutos os médicos tentam reanimar o jovem até que ele é levado para a ambulância. Bryan chegou a ser levado para o hospital, mas já chegou ao local morto.
As imagens foram anexadas ao inquérito que investiga o caso. A Polícia Civil também apura a informação de que policiais tentaram apagar as imagens gravadas pelas câmeras, e ainda teriam ameaçado os socorristas da ambulância. O soldado chegou a ser preso em flagrante, mas depois foi solto para responder aos inquéritos em liberdade. A Polícia Militar alega que o tiro foi acidental, mas abriu um processo na Corregedoria para apurar a conduta do policial no âmbito administrativo.
Investigação
Segundo a Polícia Civil, ações da PM, como a tentativa de apagar o vídeo da abordagem, a lavagem do carro das vítimas e demora na entrega da arma, dificultaram as investigações. O comando da PM rebateu essas alegações.
“O veículo estava bastante ensanguentado, então eu determinei que ele fosse lavado para que os jovens pudessem ir embora com o mínimo de conforto. Mas quero deixar claro que só fiz isso após o veículo ser devidamente liberado pela perícia. Já o armamento assim que recebemos enviamos para a perícia local. O que eu acredito que está causando essa dúvida se nós apagamos ou não apagamos [as imagens> seja a incapacidade técnica de outras pessoas de extraírem esse material do equipamento, mas não apagamos nada, as imagens estão lá”, esclareceu a tenente coronel da PM, Cenise Araújo Calanans.
Entenda o caso
Bryan morreu baleado durante uma abordagem da Polícia Militar, na madrugada de 9 de junho. Segundo informações da Polícia Militar, o carro andava em zigue-zague e um dos meninos teria derrubado alguns cones de sinalização.
Dois policiais pediram para que o carro parasse. Bryan estava no banco da frente, do lado do motorista, e levou o tiro de um dos policiais. “O policial não declara que fez o acionamento desse gatilho. Ele declara um recuo diante desse esboço de reação da vítima. E nesse recuo que ele fez, com esse passo para trás, que ele teria dado esse disparo”, explica a comandante do Batalhão da Policia Militar de Ourinhos, Cenize Araújo Calasane.
O jovem, que morava em Santa Cruz do Rio Pardo, foi atingido no pescoço. Ele foi socorrido pelo Samu, mas chegou já sem vida na Santa Casa. Fonte G1