Um novo ataque à medicina e aos brasileiros

Mais uma vez tenta-se utilizar a medicina com fins político-eleitorais. Já foi assim com o programa “Mais Médicos”. O resultado foi a vinda de profissionais estrangeiros sem a comprovação de qualificação suficiente para exercer a medicina no Brasil; além de desastrosas alterações na grade curricular de cursos de medicina e na residência médica, com sérios prejuízos à qualidade de formação dos futuros médicos.
Nesse exato instante, aliás, este mesmo programa propõe a instalação de 36 novos cursos de medicina, quando sabemos que não existem docentes suficientes e nem hospitais com infraestrutura apropriada para ensino médico no País. Se hoje a qualidade de formação deixa a desejar, o futuro avizinha-se ainda mais sombrio.
Desta vez ameaça o Governo alterar as regras da formação de especialistas, último reduto de excelência ainda não atingido. Hoje, a especialização é a única garantia de formação qualificada e do bom conceito da medicina brasileira.
Quando a presidente Dilma Rousseff propôs em seu programa de governo o projeto “Mais Especialistas”, todos já sabíamos que era uma proposta inexequível. Afinal, não há como encontrar especialistas suficientes para atender a toda demanda da população, sem um planejamento consistente para implementação em médio prazo.
Se a presidente consultasse médicos e técnicos da área da saúde, em vez de somente dar ouvidos aos marqueteiros que parecem ser atualmente os formuladores das políticas de Governo, saberia antes de apresentar a propositura que a mesma nasceria inviável. Lamentavelmente falou mais alto o interesse político-eleitoral.
Agora, na tentativa de cumprir tal promessa, o Ministério da Saúde lança o Decreto 8497, que suscita profundas alterações, para pior, na formação de médicos especialistas. O argumento apresentado foi da necessidade de regulamentar a formação nacional em cadastro de especialistas. Isso por si só reforça a ideia de que ao apresentar a proposta na campanha à Presidência da República, Dilma Rousseff não conhecia o cenário de distribuição dos especialistas em nosso país.
No entanto, basta ler atentamente os diversos artigos do decreto para vislumbrar seu real objetivo: dar ao Governo Federal a possibilidade de modificar o critério para a concessão de títulos ou de qualificação de médicos especialistas.
O artigo 14, parágrafo único, diz que caberá ao Conselho Nacional de Educação regulamentar o modelo de equivalência entre as certificações ora em vigência (que, diga-se de passagem, são aquelas que garantem a boa qualidade de formação de especialistas) com outros “cursos de especialização”. Nessa categoria, aliás, poderiam entrar cursos teóricos, com baixa carga horaria e sem treinamento prático (que em verdade existem em grande escala, mas não servem para caracterizar um especialista).
Desta forma estaríamos introduzindo um modelo de formação de médicos que não estariam habilitados do ponto de vista técnico e científico para exercer a especialidade, colocando mais uma vez a população em risco, e causando um enorme retrocesso na qualidade do exercício da medicina no Brasil.
O conjunto das entidades médicas reagiu prontamente em defesa deste que, como dissemos, é o último reduto que garante a qualidade da medicina brasileira. Por meio de ampla mobilização, alertando a sociedade e também os deputados federais, conseguiu-se acordo para que o Ministério da Saúde reveja sua posição e edite novo decreto que permita conhecer a realidade de distribuição de especialistas, sem contudo colocar em risco o modelo atual de formação destes profissionais.
As entidades médicas seguem atentas ao desenrolar dos fatos com determinação em impedir mais esta agressão à medicina brasileira e aos nossos pacientes.
Florisval Meinão, presidente da Associação Paulista de Medicina